segunda-feira, dezembro 15, 2008

de criança para criança...

Fiquei boa parte da noite em claro. Sonhos esquisitos e a agitação do Juliano com outra viagem.

Fiquei sabendo ontem de mais uma notícia de um amigo com o filho. A Marcinha, minha grande amiga passou uma coisa terrível outro dia com a criança dela. Dois meses e um risco de uma grave cirurgia.

Ainda não tenho filhos. E sei que os terei um dia. Só tenho o Fred e a Filó que são os meus nenês, por assim dizer. Fiquei me lembrando da Marcia falando sobre o que os filhos nos trazem. Um amor tão sobrenatural para os mais cabeçudos, como eu e ela. Rezei, pensei. Mal dormi.

Fiquei pensando no meu afilhado. No jeito que a vida da gente se transforma com a presença dos outros. Me lembrei do Charles há quase onze anos atrás. O Gabriel, filho dele teve mil complicações ao nascer e aquilo mobilizou pessoas de todos os cantos. Fiquei ontem pensando sobre a fé. E como a gente desconhece isso. Parece que a fé só existe depois que as coisas se resolveram. Um modo estranho de confirmar que tudo ia - e deu certo. Ela - na nossa ignorância - não serve ao seu propósito primordial: nos dar certeza.

Há um tempo atrás fiquei com questões sobre isso: afinal, a gente é ensinado a crer num Deus que se ocupa de tudo para nós. E que às vezes esse sujeito fica de mal humor e está ocupado demais para dar conta das nossas questões. Fiquei com coceiras dessa mentalidade católica. Me dei conta que essa meu desconhecer sobre a fé e sobre a minha própria capacidade de enfrentar problemas com a auto-confiança, inclusive de que sou merecedora da felicidade, me travam para prosseguir.

Acordei hoje com a rotina de semi-férias. Uma preguiça de resolver e fazer as coisas. E uma inquietação sobre isso que me roubaram o sono. Fiquei pensando nos pais, nas crianças. Em como a gente é frágil. Fiquei pensando no que dizer, em como rezar e pedir. Pensei na Marcia. No Charles. E no meu companheiro de blog, o Emanuel. Por fim, essa sensação de impotência me fez lembrar de uma história bem forte na minha família.

Gustavo, meu irmão, quando nasceu com complicações no parto, manifestou isso anos depois. Tinha uns 3 ou 4 anos, mais ou menos. Eu não sei bem o que ele teve - mas era uma coisa neurológica, com um daqueles nomes difíceis. Meu irmão sempre foi o cara frágil, sensível. Arteiro, mas silencioso. A arritmia que ele teve comprometia a sua coordenação motora (fina?) se não me engano e ele teria dificuldade com uma letra caprichada, mas nada ligado à aprendizagem cognitiva. Me lembro muito das conversas dos meus pais que falavam as coisas em códigos achando que eu não entendia. Gu tomou remédio por algum tempo. Fez um longo tratamento. Mas de verdade, o pânico da minha mãe se resolveu - ou pelo menos se acalmou - quando fizemos em casa uns quadradinhos de madeira com as letras gravadas em lixas. Ele tinha que ficar passando o dedinho ali para alinhar a coordenação. Me4 lembro bem que eu não entendia porque ele tinha que ficar "brincando com as lixas", mas ficava com ele e a minha mãe. Horas e horas todos os dias.

O tempo passou e as preocupações - constantes - se transformaram em uma sensação de conquista. A gente tinha acabado de sair de Porto Alegre e vindo para São Paulo. Não tínhamos ninguém aqui da família. Os amigos, contávamos nos dedos de uma mão. Não havia nada nem ninguém além de nós 5. A Clara, a minha irmã mais nova, não tinha nem um ano.

Lembro do Gu indo para a escola com medo de ter uma crise de novo. Minha mãe se preocupava e eu tinha um senso de proteção com ele, apesar das brigas que a gente tinha. Eu era bastante chata com os meus irmãos, mas os defendia. Me lembro de socar vários coleguinhas dele que o ameaçaram na escola. Era o meu jeito de dizer que me importava.

Ficamos anos convivendo com isso. Com o receio, as idas ao hospital para dar pontos na cabeça dele toda a vez que ele batia com ela em alguma quina. As consultas na neurologista (me lembro que era uma mulher inteligentíssima, que lia revistas em francês e eu ficava folheando isso tentanto entender alguma coisa enquanto esperava a consulta terminar) e os exames que ele tinha que fazer periodicamente (isso eu gostava de olhar porque os eletrodos me lembravam os filmes de ficção científica que eu via com o meu pai).

Hoje, anos depois, meu irmão está terminando o mestrado em astronomia. É um físico incrível e um dos geninhos da família. Mas muito mais que isso, ele é um testemunho pra mim da paciência, que eu nunca tive, de esperar e ver as coisas acontecerem. De perseverança. E mais, de resignação. E de uma resignação que, como li outro dia, é uma aceitação com o coração, não com a cabeça. O Gustavo certamente tem isso. Ele me inspirou sempre, sobretudo porque nunca perdeu a ternura. Ou os risos. Ele tem o maior sorriso do mundo. (se ele ler isso vai achar que é piada! ele tem uma boca enorme!) E toda a vez que eu o vejo, aqui em casa falando bobagem, dançando, discutindo filosofia comigo, ou arrumando o meu computador, me lembro da gente no quintal de casa com os dedinhos nas lixas. Me lembro dos tombos de bicicleta. Das brigas. Das vezes que eu não queria que ele saisse comigo porque o achava um pirralho! Das conversas e dos abraços que foram se sofisticando, nas sutilezas. De coisas que ele me falava, me perguntava. Me lembrei das minhas apresentações de ballet em que ele era o que mais me aplaudia... e essa inspiração toda de sorrir. Exatamente como o poema do Chaplin que postei outro dia.

Tem coisas lindas que o outro ensina pra nós sem se dar conta. Mal sabe ele que até hoje eu recordo dessas coisas. E do quanto eu sou grata a ele por esse aprendizado. Que veio de criança. Para criança. E que ainda hoje me revela que o nosso descontrole sobre o mundo, sobre nós e a vida, é o que nos revela, verdadeiramente a natureza dos milagres. O sublime.

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domingo, dezembro 14, 2008

Essa semana, parece, finalmente terminam as reformas aqui de casa. Achei engraçado - já devo ter mencionado isso - que esse fim de reforma - e o clássico ritual de arrumar a casa - encerram um ciclo de grandes arrumações internas.

Hoje, ao passar numa livraria visitei a sessão de astrologia. Sempre gostei de ler essas coisas no fim do ano. Não que eu acredite nelas. Mas a sensação de que alguém pode saber do que vai acontecer com o mundo me deixa um pouco mais tranquila nessas cachoeiras imprevisíveis do viver.

Obviamente não falarei das previsões. Isso se faz nas livrarias. Mas achei divertido sair dali e ficar perambulando nas minhas lembranças. Tenho feito muitas retrospectivas da minha vida. E tentado direcionar coisas para um futuro bem próximo, vamos assim dizer.

Hoje cedo, colocando o espelho no banheiro, fiquei pensando sobre os espelhos que atravessam o meu dia. Lembrei de sonhos que hoje pouco importam. Pessoas que perderam-se nos seus (in)significados. Dos desejos. Das coisas de aqui e ali. Olhei a casa hoje. Diversas vezes parei para olhar os nossos livros e as nossas fotos. Engraçado que parece pra mim o mais palpável do Nosso. Aquilo que fica de materializado de mim e dele pela casa. Claro, há outros sinais. As almofadas. Velas. Coisinhas por todas as partes. Mas projetamos tanto de nós naquelas fotografias. E os livros espelham conversas, desejos, desentendimentos. Sonhos. Desencantos. Aprendizados. Fiquei olhando ele suspenso na escada pendurando para colocar o espelho na parede. Ri de mim mesma tendo essas elocubrações enquanto alcançava chave de fenda e martelo.

Quando saíamos de casa depois... fiquei olhando a porta se fechando. Quanto há de nós nessas paredes. Tão isolados do mundo ali. E o quanto do mundo atravessa essas construções que às vezes parecem só nossas...

Foi bom olhar tudo isso e sentir que uma nova relação se faz - todo o momento - quando me permito escavar os fantasmas de mim e deixar a luz do sol bater nas minhas janelas. Renovo o ar me deixando levar pela vida sem querer congelar nada dentro de mim. Sem deixar que nada apodreça. É bom ve-lo apaixonado. Sentir o desejo, a ternura e o cuidado dele comigo. Ver que um esforço genuino de transformação parte dele sem que eu o peça... E que isso tudo vem de nós. de um mistério de querer. E deixar.

Há uma reforma dentro de casa que nunca termina.

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terça-feira, dezembro 09, 2008

Ainda sobre o tempo. Esse ano me dei conta da passagem do tempo por alguns motivos curiosos. Um par de motivos curiosos foi o casamento do Vinícius e o nascimento da Laura, filha da Marcia.

Há quatro anos atrás me lembro de nós 3 muito preocupados com outras coisas. Muitas outras, menos filhos e casamentos. Eu estava com um namoro afundado, a Marcia um casamento destruido e o Vinicius em pleno encantamento pela amada.

Fomos juntos no aniversario da Tereza, onde conheci o Juliano. Chovia muito e o meu mau-humor naquela ocasião só me traziam perspectivas ruins. Esse ano vi a Marcia ser mãe. Gravidíssima com uma barriga linda de morrer. Reclamenta, como sempre. Mas em clara transformação pela maternidade. Se transfigurando. Foi lindo. Nunca achei que veria a Marcinha assim. Ela sempre dizia que não queria filhos, que isso e aquilo. Mas pude ser testemunha do que a Laura fez a ela, desde o início. Hoje a pequenina está fofa, sorridente. E a mãe mais ainda.

O Vinícius... puxa! Casado! Feliz e mestre! Bom ver o melhor amigo numa situação dessas. Estou orgulhosa dele. E ao mesmo tempo, sem me surpreender. Já esperava que ele teria um futuro (próximo) bom. Merecido.

Olho os meus dois amigos como testemunha do tempo. Mais que de amizade. Isso está em tudo o que falo e sinto deles. Mas o tempo... Eles presenciaram, certamente, coisas da Thais que nem ela esperava. Das mais intensas rupturas. Corte de entranhas para um desenlace de si mesma. Foram as testemunhas mais fiéis. Silenciosas. E briguentas também. Dos conselhos mais sábios. Dos poucos que eu escuto. Irmãos mais velhos.

Hoje passei o dia fazendo coisinhas aqui e ali. Sempre me deparo com as fotos deles pela casa. E pela lembrança do quanto fazem parte da minha vida. Eu me surpreendo. Como o tempo pode ser generoso e permitir que a gente veja pessoas especiais permanecerem na nossa vida. E uma permanência que aflora, não gangrena. Olho pra eles hoje e pra mim, com a minha trajetória... cheia de momentos de sim e não, talvez, quem sabe, desisto e deixa pra lá... com umas conquistas... que só o tempo dá.

Senti saudades dos dois hoje. Daquela noite de chuva forte em 2004. Fazia frio. Das broncas da Marcia e do Vinícius. E do jeito desajeitado que sempre cuidaram de mim. Senti saudades das noitadas com a Marcia, das rizadas e de todas as conversas profundas sobre a vida e o futuro da humanidade que eu tinha com o Vinícius. Fico olhando a árvore da USP, palco desses monólogos. E hoje, a humanidade continua a mesma (provavelmente há uns 100 milhões de anos assim...), mas sem a árvore na USP. E sem o Vinícius tão perto.

Fiquei refletindo sobre os meus apegos. E me sentindo bem - e apegada - ao que pode se transformar no tempo. Às ondas do viver que me golpeiam por dentro. E ainda me deixam perplexa, surpresa pensando - e sentindo - o poder de estar vivo. Por dentro.

Quis dizer tudo isso a eles hoje. Fiquei sem jeito de ligar e despejar essa coisa enlouquecida dentro de mim. Ficou uma saudade de mudar mais. E poder testemunhar esse devir. Sem previsões. Sem pressa. Que vem debaixo de chuva... deixando o sol vir do jeito certo.

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quarta-feira, dezembro 03, 2008

negociando com o tempo

Depois de reler o Sandman fiquei fantasiando que o Tempo deve ser uma entidade daquele tipo. Sinistra e descolada. Fiquei imaginando como o Neil Gaiman desenharia esse sujeitinho tão presente (e ausente) na nossa existência.

Tirei o atraso de algumas coisas nessa primeira semana de quase sossego: assisti E o vento levou mais uma vez.

Revivi meus momentos de Scarlet e as coisas que o Tempo provoca na gente. Esse papo todo de amadurecer. Há alguns dias atrás ouvi que era preciso negociar com o tempo. Tenho pressa em fazer esse mestrado, terminar a pesquisa, finalizar. Encerrar e poder outra vez começar outra coisa. Há muitos planos. Um medo desse desconhecido, tão próximo de mim. Uma vontade de atravessar as fronteiras e invadir esses territórios meus e dos outros.

E a ansiedade volta. Fica. Permanece... Li. joguei papéis fora, arrumei armários. E ainda sinto essa desorganização aqui em mim. Uma confusão de priorizar todas as vontades. Tirar o atrazo. Mas quem me disse que estou atrasada? De repente me senti tomando café da manhã com o coelho branco de Alice no país das Maravilhas. Tenho pressa pra tudo. Olhei minha vida nos dois últimos anos. Só corri. Nem sei bem para que... para quem... mas para mim não foi...

Ou corri de mim...

Estou bem agora. Tenho o Tempo comigo. Preciso usa-lo ao meu favor... mas ainda nao sei de que jeito. Ou como diz o velho ditado, nao sei quanto tempo o tempo tem... Fantasiei outras coisas... Olhei os calendários. Tentei organizar agendas, metas, prioridades. E tudo o que me restou foi uma perplexidade completa diante do Tempo. Me lembrei da época que frequentava a faculdade de física e ouvia as loucuras e teorias - físicas - sobre o tempo. Até a blasfêmia para um historiador: o Tempo não existe. Não ousaria discutir isso. Acho que há capacitados... mas até essa constatação me assusta. O que se tem? Não temos nada, só que somos. E até isso parece intangível demais para nós...

Quis parar o tempo. Como se param filmes, livros. Congelar. Me lembrei do meu apego às pessoas e aos lugares. É. Sou muitíssimo apegada. Fico tentando segurar os momentos por entre os dedos. E me incomoda como escorregam da gente. Ontem recebi meus irmãos em casa. Foi uma delícia e ficamos rindo até de madrugada escutando música... quis congelar aquilo... diante dos meus olhos. E me dei conta nesse momento que eu viveria uma vida congelada. Cheia de momentos assim. Com amigos, com família. E que desse imenso iceberg eu jamais poderia caminhar ou sair. Que morreria de frio em mim mesma. E que tudo o que eu pudesse, reteria. Como um grande buraco negro, faminto de felicidade... que tragaria pessoas. Não seria livre. E nem deixaria ninguém livre - de mim. Achei graça dessa imagem. E naquele instante disse ao Coelho Branco para tomar um chá de cidreira. Ou um suquinho de maracujá... e que esperasse mais um pouco. Desenhei o tempo como um grande polvo. Cheio de braços, que me lançavam longe e me traziam de volta. E eu seria minimamente um io-io simpático... que saberia ir. E voltar. E me divertiria de estar nos braços do Tempo, saracoteando pelo Universo.

Me lembrei do Pequeno Príncipe. E aquelas viagens nos cometas... poder ir, voltar, esperar, ficar. Isso o Tempo deve permitir. Marquei uma entrevista com ele. Para ser feita durante a vida. É o tempo que ele tinha na agenda. Ficamos de "ir conversando"... E que ele seria o primeiro a me receber... depois o Sandman, o Destino, o Delírio. E depois a Morte. E depois... só depois.

Pus a água na chaleira... e vou esperar a hora do chá.

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