Essa semana foi muito particular em termos de reconhecimento. Passei o carnaval reconhecendo o Juliano que, se transformando e se descobrindo todo dia, me deixa mais apaixonada. Até pelas idiossincrasias do moço. (que ele não leia...)
Fiquei muito meditativa no feriado. Longe do que costumava fazer há 13 anos... ok. sem culpas. Senti saudade de um tempo bom da minha vida. De pessoas que fizeram parte dele de em jeito tão intenso... e que eu achava que ia ser pra sempre. Pois bem. passou. Daí eu transitei pelo mundo fantástico do Neil Gaiman e dos filhos do Anansi, de gente esquisita, de Fat Charlie e sua insegurança em reconhecer que podia fazer algo. Depois fiz unma consulta rápida com a Srta Emily Dickinson... a conversa foi mais séria do que a que eu tive com Fernando Pessoa.
Quarta-feira de cinzas básica. Recolhendo os meus cinzeiros interiores por aí, sem conseguir organizar nada para escrever. Ajeitei a casa. Recebo então um telefonema maroto do Zé Paulo, aquele meu aluno que me encanta até hoje. "A gente pode mesmo te visitar?" E vieram. Ele, o Guilherme Germano, o Fredy e o Vinícius. Dos dois primeiros eu tinha certeza do carinho, mas os dois últimos, não. Eu não tinha idéia que cultivavam de verdade esse sentimento por mim. Imaginava, mas ainda não podia sentir...
Foi uma tarde maravilhosa e esse encontro com alunos sempre me dá vontade de escrever. Eu morro de saudades dessa classe. Adorei testemunhar uns momentos tão intensos de desabrochar. Eles vieram me trazer um vídeo. Sobre um projeto que tinham feito na escola no ano em que eu saí. Ainda relutava em acreditar que a imaginação e o humor deles tinham se somado a uma perspicácia crítica impressionante. E como eu me surpreendi que todas as coisas que eu julguei bobas, exemplos fáceis, triviais, de serem absorvidos numa aula de história foram reapropriados com tamanha agulhada! Imaginem uma mistura de big brother (em sua acepção original do Sr. Orwell se revolvendo na tumba com as falas do Bial!) Sr dos Anéis (Sr Jackson, se cuide, as gerações novas estão passando dos 15 anos!) Star Wars (sem comentários!) Branca de Neve, The Wall. Trilhas originais. Humor crítico (pensei de mostrar isso aos pseudo-humoristas que temos hoje, esses que só fazem rir com cócegas...).
Não contaria aqui a narrativa. Mas fiquei impressionada, novamente, como os adolescentes sacam coisas numa rotina escolar em que os profissionais da educação se esforçam - e se convencem disso! - para esconder dos alunos.
Fiquei orgulhosa deles. De todos. De perceber homens e mulheres que estão se tornando. Íntegros, apesar das crises. Sinceros com o que se sentem. E inseguros pelo que pode vir das mãos dos outros, as quais não controlamos.
Eu ficava olhando para aqueles 4 meninos sentados na minha sala discutindo os poréns da educação, da vida no país, sobre preconceito, autoridade, honestidade, namoro e convivência. Estava tão deslumbrada que a fala faltava. Os egípcios tinham razão em admirar a flor de lótus, que nascia nos locais mais impossíveis e desacreditados. Reconheci neles sementes minhas que tinham sido lançadas, até sem querer, por desatino mesmo... e vi o trabalho de 4 jardineiros... com jardins encantadores. Todos com perfumes e flores coloridas, particulares, diferentes entre si. E todos belos. Me senti feliz por ter acompanhado esse plantio das primeiras safras. Oxalá eu veja a extensão disso nos próximos anos. Percebi que a vida é bem generosa com a gente, apesar de todos os desafios. No meio de um lugar que machucou demais a mim, aos meus amigos, vi uma possibilidade de transformação da e na dor. A gente se supera, se surpreende.
E o Julio, mais uma vez... tinha razão. É só a gente acreditar no possível. Aos meus ex-alunos, a minha gratidão (esse texto deve estar quase piegas para alguns... paciência...) e admiração por me devolverem algo que eu achei que tinha perdido. Acabei de reconhecer a Thais na outra esquina.
domingo, fevereiro 25, 2007
reconhecendo
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coincidindo
A Márcia vai casar... dia 17 de março deste ano. Talvez seja o primeiro casamento em que eu vá cujo envolvimento emocional com a figura é verdadeiramente profundo... o do Geraldo também...
Sempre gostei de casamentos. Sempre chorei em todos eles. Acho bonito aquele papo de "até que a morte os separe", "sejam felizes para sempre", os juramentos (com exceção daqueles em que a mulher tem que servir o marido, francamente...). Mas adoro a idéia. A original. De que você escolhe (e é escolhido, claro) uma pessoa no meio de 6 bihões de outras estranhas e familiares pessoas no nosso pequeno planetinha para testemunhar a sua vida.
Mas voltando à Márcia... ela é uma espécie de irmã mais velha. Já devo ter dito isso aqui, mas ela testemunhou de perto um dos momentos mais transformadores - e redentores - da minha vida. Fomos juntas um dia, depois de uma daquelas infernais reuniões que tínhamos às 2as feiras, assistir um filme no cinema. Dança comigo. A versão nova, do charmosíssimo Richard Gere... o roteiro falava de uma coisa que posteriormente iríamos viver com tamanha intensidade que deveríamos ter levado caderninhos para anotar. O que ocorre depois que você encontra a pessoa amada, a conquista, constrói sonhos e vida com ela? Manutenção. A palavra soa pesada - parece que você vai consertar eletrodomésticos e carros, mas é quase isso, com a diferença clara - a ausência de manuais de instrução.
O filme fala de uma história de amor 20 anos depois... o sujeito está triste, com a sua própria vida... e ainda ama a mulher. É difícil explicar - e entender - ao outro que você está infeliz e não é por causa dele. Há um diálogo em que a mulher pergunta ao detetive particular (olha a que ponto chega a manutenção...) por que as pessoas se casam. E a resposta é direta, sem floreios, dada por ela mesma. As pessoas se casam porque a vida é muito solitária, difícil. E tanta coisa acontece com a gente que precisamos de uma testemunha para presenciar a nossa existência na Terra. Isso me atravessou e pela primeira vez em muitos anos, percebi que era esse o sentido mesmo disso que chamamos de casamento. E amor, pré-requisito disso, é talvez o motor que nos faça querer continuar testemunhando a vida do outro. E ninguém disse que testemunha é um servicinho mole.
Eu me lembro bem de sair do cinema super emocionada com o filme. Márcia ainda não tinha o Marcos. Eu já tinha o Juliano, mas pensei que dizer isso a ele, com todas as dificuldades sentimentais do moço, seria apelar. Passei dias rascunhando sentires no meu caderninho. Nem pensamentos eu formalizava. Mudanças tão rápidas dentro e fora de mim...
Essa semana eu fiz aniversário de noivado. É engraçado como nós, mulheres, temos o hábito de cultivar datas e dizer que elas são importantes. Outro dia pensei: são números e ponto. Por que a gente leva tão a sério o fato de que nem tudo é exato, preciso, inteligível? O meu aniversário não foi tão bom como o dia do noivado propriamente dito. Me lembro dos meus pais e irmãos naquele dia lendo corações e cantando... Lembro do Juliano, tão menino, sem jeito, ansioso. Lembro de mim...
Fiquei muito triste nesse dia. Um desapontamento com o serviço testemunhal que me fez ter preguiça de olhar, sentir, e ver... E a Márcia parece, na sua ausência, testemunhar todo o meu sentir que, de tão intenso, explode umas fronteiras invisíveis... Quando eu tinha chegado em casa, depois desse dia silencioso e barulhento parei na escada e dei de cara com aquela letrinha num envelope bonito e braquinho... a letra dela é inconfundível - professora de português à moda antiga!
Fui subindo a escada como se quisesse atingir os degraus mais altos do meu pensamento. Decifrando o interior à medida que abria o envelope. MM. Era o convite de casamento da menina. Eu sabia que ela ia me mandar, sabia que ia chegar naqueles dias. Tinha ajudado a palpitar o vestido de noiva dela... Uma multidão de imagens se encontraram juntas na minha retina pra ver o convite dela. Lembro das risadas, dos desencantos com a vida, das baladas e das bebedeiras. Isso tudo estava ali, testemunhando a Márcia chegando no altar do coração dela. O tapete colocado era bem longo e às vezes, desbotado, outras com vermelhos reluzantes disputando o seu lugar aos pés dela. Tive vontade de ligar pra ela aquela noite. Mas achei melhor rascunhar isso aqui. Era tanta emoção que o telefone ia arrebentar a minha vontade de comemorar. Silêncio. Quando abri a porta de casa e vi o Juliano chegando atrás de mim, desliguei... comemorei quietinha com as imagens dançando a marcha nupcial na minha cabeça. "Chegou o convite de casamento da Márcia..." "Ah! que legal!!!"
Não dormi aquela noite. Doía o peito, chorei bastante. Por que dói tanto? Ainda não consigo continuar os passos no tapete... até pensei em enrolá-lo de novo, colocá-lo embaixo do braço e sair dançando por aí. Quem sabe dava de cara com o Richard Gere no shopping subindo a escada rolante de smoking e com uma rosa na mão... aquele olhar apertadinho... Mas na hora me dei conta que a rosa era pra mulher dele e que ele ia repetir de novo "a gente tem tanto... que eu tinha vergonha de te dizer que me sentia infeliz e que você não tem culpa disso..." Então resolvi desligar o botãozinho da fantasia toda... ia ficar com ciúmes dela. Virei pro lado e deixei a cortina dançar aquela noite, com o vento. Eles sempre se encontram na minha janela, toda noite, e dançam e, sem se dar conta, me mostramostrando que, ainda oscilante a música, é possível dançar, mesmo em silêncio...
Márcia, quero te ver dançar na festa do teu coração. Obrigada por me convidar para testemunhar isso...
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quarta-feira, fevereiro 14, 2007
semeando
Eu não tenho escrito muito esse ano. Nem é pelo volume de trabalho, que está intenso, mais talvez pela superstição do ritual pra mim...
Minha viagem ao Rio de Janeiro neste trânsito de 06-07 foi recheada de surpresas, boas, intensas, e outras não muito surpreendentes. Na verdade o fato é que a gente vai se acostumando com as nossas próprias surpresas.
Voltei para a terapia na semana passada. Não foram férias da terapeuta, mas de mim... O mais complicado nessa parada toda é que a gente não tira férias da gente, por mais que a gente se esforce (ops, se esforçar pra tirar férias não me parece muito convincente). Queria meus direitos trabalhistas, mas o Criador às vezes tem um tom meio patronal. Não é pra menos. O sujeito cria o mundo em 6 dias... e tira um de descanso... nada mal.
Ontem eu fiquei pensando nos caminhos engraçados da vida. Saí da escola tarde, depois de um semi-castigo pelo rodízio, lendo Filhos de Anansi. Pensando nas aranhas da minha cabeça, tão irônicas como as minhocas, escondidas. Liguei o som no carro, me aproveitando dos vidros escuros para poder ouvir um mp3 sem culpa... e multas. Star Wars. Realizando pequenos delírios de infância: trilha sonora para dirigir em alta velocidade. Foi divertido. até consegui simular uma fuga do campo de asteróides cortando o trânsito na Av Brasil. Ao menos a minha Millenium Falcon está mais inteira do que a original e não precisou de uns tapinhas...
Cheguei na terapia com o sangue quente, estimulado pela trilha sonora do Mestre John Williams e pelos vômitos do peito na cabeça. Não sei qual deles é mais forte em mim, a cabeça ou o coração. Mas vi fortemente a disputa de queda de braço no meu corpo. Péssimo lugar pra lutarem. Despejei as latas, os sacos, os entulhos do peito... doeu. Nem sabia olhar pra mim e reconhecer essa parte mais monstruosa, feia, disforme, da raiva, da incompreensão. Saí de lá nada pacificada, ao contrário. Mas querendo muito crescer a minha paciência e não acabar com tudo de uma vez... A Georgina me dizia sobre o lado lúdico da vida...
Hoje cedo Juliano me dizia que sou protagonista de tudo o que vivo. Na verdade foi mais romântico que isso. Algo do tipo "viver com você é deixar você protagonizar a vida, mesmo que seja como cenário." mais ou menos isso... Estava aqui ensaiando arrumar as minhas coisas para trabalhar e me deu uma coceira nos dedos. É tão difícil a gente se protagonizar. Acho que é a tarefa mais difícil da vida. Saber a hora de entrar no palco, se maquiar, trocar de roupa. Respeitar a iluminação, a trilha sonora. São muitos timings diferentes... e eu nem consigo decorar tudo. Puro curso de improviso essa vida.
E isso me dá saudades da Dani. A Dani Palhaça que trabalhou comigo ano passado inteiro. Foi minha irmã. Presenciou momentos dilacerantes sem saber de nada. Nem precisava falar pra ela, só estar ali. Nos conhecemos numa segunda feira, em meio a uma reunião de trabalho, gente pouco conhecida, exceto pela Jerusa, que me levou ao pessoal. 5 mulheres! Que medo, mal sabia eu... E a loucura toda disso foi a descoberta diária que a Dani trazia a Thais mais alegre de volta. A alegre palhaça mesmo, que assume os erros, ri das próprias fragilidades. Bem piegas, pode parecer...
Estar com ela era o momento mais esperado da semana. Depois de dias de loucura, trabalhos pra ontem, crises existenciais de todos tipos, tamanhos e cores, o espetáculo começava quando ela aparecia. Eu assistia ela. É uma das poucas (bem poucas mesmo) pessoas que eu gosto de escutar. Assistia ela comendo doces, no meu circo privado. Tão cheio de srtas T ao redor, tristes, alegres, passivas, escondidas. A Dani tinha uma capacidade incrível de me desconstruir, de me tirar de mim. De me proteger de mim mesma. Eu passava um tempão pedindo para ela imitar as pessoas. As minhas verdadeiras aulas eram com ela, no planejamento.
Há momentos inesquecíveis com ela. Recordo do dia no Frans Café que, ao "continuar o planejamento das aulas" abrimos as comportas uma pra outra. Falamos tanto das vidas... e depois, minutos depois, nos encontramos no supermercado... A história do mantegueiro... Outro dia o carro dela quebrou na estrada. Ficamos fazendo caretas e simulando modos de pedir socorro. Ao surgir um cara na estrada, assustadas, começamos a planejar como atacá-lo caso ele viesse pra cima da gente. Em meio a isso tudo ainda paramos pra tirar umas fotos com poses de As panteras. Ríamos o tempo todo. Sem parar. Gostava do jeito que ela quebrava a prepotência das pessoas. Riam dela, rindo deles mesmos.
Para o meu casamento ela planejava um número de palhaça, sendo a juiza de paz... Eu me acabava de rir pensando na cara do Juliano, que se diz tão tímido. Ainda quero ver isso.
Esse ano ela vai pra África. Vi o Jardineiro Fiel e me lembrei dela. Como fazer pro riso surgir ali naquela gente tão árida pela dor e pela privação? Não nos falamos mais esse ano, sei que ela está numa correria absurda, cheia de idas, talvez sem as vindas... saudade de você menina...
No fim do ano passado no nosso amigo secreto do absurdo dei a ela o jardim da minha casa. Juliano e eu plantamos muitas coisas no nosso apartamento. Dei a ela. Fiz o presente pra ela. Eu sei que ela sempre se sentiu bem aqui em casa e queria que ela levasse essa sensação pra lá, seja onde lá for. Montei tudo numa caixinha onde guardava cartinhas de alunos meus... ficou mimoso.
Que eu não seja o jardim... mas seja fiel. Continuo arando na terapia... , plantando no Nosso, sem férias, levando a sério os dizeres do Criador... ganharás o pão com o suor do teu rosto... Dani, se você puder, volta...
Postado por Srta T às 9:47 AM 0 comentários