Ontem quase meia noite e eu saía na pressa de chegar em casa ou ligar ao menos antes da virada do dia. Depois de uma janta à lá egípcia com as definições das leituras e caminhos do mestrado me dei conta que outros caminhos precisavam ser revividos na minha vida. Eu adoro celebrações. De todo tipo. Pequenos rituais que nos lembram que estamos além do trivial, do comum. E que nos fazem sentir especiais.
22 de fevereiro. 2005. Eram 6 meses juntos quando esse anelzinho dourado veio parar no meu dedo pra me lembrar que essas alianças só podem existir de verdade no espírito. Nem na mente. Nela não cabe. Me lembro bem do dia. Do dia anterior e do seguinte... Lembro do nervoso e do pré-combinado do Juliano com o povo lá de casa. Lembro bem da minha cara de paisagem quando ouvi o pedido, que era tão de dentro daquele coração. E do meu sim. Tão cheio de certezas também...
Lembro do filme todo, da sequência de imagens, dos sons, das texturas e gestos. O que eu não podia prever naquele dia era o mundo de descobertas de mim e do Nosso que estavam por vir... Definitivamente não. Engraçado como o baile de máscaras terminou em mim aos poucos pra dar lugar a uma valsa lentinha no meu coração. Apaixonada e num salão gigante. Só com a gente dançando. A orquestra afastada, pra deixar a gente se fungar e dar uns beijinhos marotos um no outro... e as cortinas balançando com o vento... Demorado. Eterno. Só da gente.
Outro dia o Juliano me perguntou - daquele jetinho dele - se eu expunha a nossa intimidade aqui. Demorei pra responder. Quase tive medo que sim. Mas mais que isso. Hoje, não sei ser a Thais sem ele na minha vida... Por certo que isso parece piegas... Não me importa.
Hoje o dia 22 de todo mês como todos os minutos 22, e horas, e toda sorte de coisas curiosas e - minimamente - misteriosas com esse número me dá a sensação de completude. Aqueles lembretes que o coração manda pra cabeça numa folha de postit enorme e brilhante.
Se eu escrevo sobre nós? Me pergunto hoje o que há de só meu. Semana passada, saindo de um casamento de amigos eu comentava sobre o papo da "comunhão parcial de bens"... Fiquei pensando sobre como era ritualizar uma união parcial. Não entendia. Lembro que no meio da explicação que ele me dava (aliás, ele adora explicar coisas pra mim... ) parou no trânsito, me olhou e riu. "O amor não pode ser pela metade né?". Isso. E por mais que outros tentem me convencer sobre as garantias da modernidade, sobre as incertezas do amanhã sobre o amor, o outro e tal... a cada dia, em mim, por mais que existam as incertezas do passado, eu não sei viver um amor parcelados, sem juros, correção, inflação, crises no câmbio, risco de sobretaxa e etc.
Eu disse isso a ele um dia antes da gente começar a namorar. Que eu não queria ser metade de mim com ele. Só que nunca imaginei a profundidade dessa - quase profética - sentença. A outra metade nem sempre é legal, compreensiva. Nem sempre perdoa. Minhoca. Discute. Implica. Cutuca. E é tão humana. Tão incerta. Tão em si. Cheia de medos. Fiquei pensando se isso não é comunhão total de bens, de más, de todas as coisas que de fato são minhas...
Uma vez o Geraldo me disse que a gente ganhava o pacote no casamento... é verdade... E que as coisas que saem dali podem ser surpreendentes. Ou muito previséveis. Tudo o que tenho aprendido nesses anos - quase 4 - juntos é que quanto mais eu me quero mais tenho que dar de mim. E tenho ganhado tantos presentes desse amor. Que fazem dor, luz, amar, crescer. E querer. Continuar. Deixar. Esperar. Sem saber. Sem querer. Dar. Receber. Fechar os olhos e ter a certeza de que tudo o de incerto e misterioso e belo ainda estão por vir. Tão certo como 2 e 2 são 3...
sexta-feira, fevereiro 22, 2008
2 e 2 são 3
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quarta-feira, fevereiro 20, 2008
o castelo além-mar
Eu vi a menina do barquinho na semana passada. Tive a sensação, ao olhar pra ela ainda longe que as coisas estavam mal. Ela chorava na beira da praia. Compulsivamente. O barquinho tida ido embora. Pra longe dela. E as pessoas que ela tinha visto embarcar pareciam ter se afogado naquele choro interminável...
Ela me contou - virada de costas pra mim, cheia de timidez e vergonha do choro - que tinha visto e ouvido coisas muito tristes. Falou de um sonho de atravessar o oceano que tinha sido quase naufragado. Tinham dito coisas feias pra ela. Desse tipo de coisas que as pessoas inseguras dizem pra se defender, sabe? Acontece que com toda aquela sensibilidade ela tinha dado tanta importância pra isso... Me disse que depois de fazer a mala e separar um lenço vermelho bonito pra se despedir na hora da viagem... me contou que esperava muito - e há muito tempo - a hora de ir, de deixar as coisas todas pra trás e seguir um rumo que nem ela sabia direito qual era. Novos ares, novas gentes, paisagens e cheiros. Estava quase sorrindo quando falava desse momento de partida. Mas daí a pequena desabou em si de novo. Contou pra mim que não achavam que ela tinha condições de fazer aquilo. Mais ainda... que ela precisava parar de chorar e ficar se fazendo de coitadinha, afinal a vida era difícil mesmo.
Não tinha a menor idéia do que dizer pra ela. Peguei os seus dedinhos amarrados em si e pedi pra ela desenhar na areia. Ela me contou de um outro dia em que ela fazia um castelo bacana na areia. Nada sofisticado. Um castelinho que cabia muitas pessoas nobres, reis, rainhas, princesas e príncipes encantados. As pessoas eram bem felizes ali no castelo, tinha festa todo o dia e ela gostava de dançar ao som da música que os instrumentos brincavam. Perguntei onde ficava esse castelo. Ela me respondeu que era ali bem pertinho do porto de onde os barcos partiam pro outro lado do Oceano. Mas ela também não tinha estado lá de verdade. Só ouvia a música e ouvia as pessoas que chegavam de lá contando como era legal e bonita aquela festa. Ela sempre quis participar e receber um convite de honra do rei pra poder valsar e brincar como todos aqueles que retornavam.
Foi aí que ela contou que não queriam que ela fosse também pra lá. Ou se queriam, não fizeram muita coisa pra que ela pudesse participar. Sabe como é... as pessoas até querem que vocÊ faça as coisas, querem te ver feliz. Mas parece que essa felicidade é um castelo tão suntuoso que dá mais trabalho ainda de ir visitar. No caso da menina não. Ela repetidamente me dizia que o castelo que ela sonhava - de tanto ouvir falar - era grande, mas as paredes eram feitas de pedrinhas de riso. Isso mesmo. O chão era pintado com carinho e amizade e não existia teto. Nem porta. Cabia todo mundo ali.
Disse que um moço explicou a ela todas as dificuldades de visitar o castelo e fazer parte da festa. Ele disse tantas coisas que ela desanimou. Chorava dizendo que o castelo estava se perdendo em caminhos os quais os mapas e as cartas náuticas antigas não mostravam... Esse rapaz ainda fez toda uma projeção de gastos sobre a viagem dela até lá. Parecia tão difícil. Um dia, quando ela estava fazendo esse castelo na areia e seguindo todas as instruções mentais que o moço tinha dado - quase como fazendo contade cabeça em voz alta - veio uma onda muito forte e dele sobrou uma torre de observação quase desmoronada...
Ela me disse que não queria mais falar disso com ninguém. Que o castelo parecia ficar mais longe e ela mais distante ainda das pessoas legais que frequentavam aquelas festas alegres e coloridas. Perguntei se ela tinha desistido. Ela disse que por enquanto ela só conseguia chorar. Se sentia sozinha porque as pessoas não entendiam como ela ia chegar ao castelo desse jeito. Desse jeito dela. E diziam coisas comuns do tipo "vai dar certo", ou ainda "não se preocupe que se não for agora, vai ser depois". Essas frases vazias de quem não sabe como acolher um coraçãozinho apertado. Foi bom ela ter dito porque eu quase disse a primeira frase...
Engraçado que nessa hora ela me olhou nos olhos. Deu uma risadinha de canto de boca. Apareceram duas covinhas perto dos lábios... Ela era tão bonitinha! Fiquei sem graça com aquela espontaneidade. Eu sempre gostava de conversar com ela justamente por isso. Ela me dizia coisas que eu gostava de aprender e sentir. Levava pra casa no peito por semanas...
Silenciei. Era pôr-do-sol naquele mar azul-prata-esverdeado-que-nem-os-olhos-chorões-dela... Segurei a mãozinha pequena, cheia de areia nos dedos. Passavam umas pessoas apressadas na beira do mar. A gente ouvia os sons dos passarinhos e os roncos de outros barquinhos que deportavam dali. Perguntei se ela estava melhor. "Você sabe de alguém que possa falar com o meu coração?" Travei... E ficamos ali nos olhando mais um pouquinho até o sol baixar de vez e a lua surgir no outro canto do céu.
Postado por Srta T às 9:31 AM 0 comentários
outros eclipses
Estive ontem na casa do Jedi, depois de muitos meses sem nos vermos. Ele ainda mora na república Taleban, com os mancebos Du, Igor, Leo. Acho ainda que é o último remanescente da velha convivência da faculdade que eu encontro. Fui lá me refugiar nesses dias de quase sufoco (de)em mim mesma. São tantas imagens, informações de um passado que eu não posso mudar, nem acessar mais. Quem sabe imaginar... mas de fato ainda não sei deixá-lo ir.
Acho que fui em busca do Jedi porque a gente tem uma dinâmica de afastamento muito parecida. É aquele amigo que, mesmo depois de anos sem ver, é como se eu acabasse de sair do boteco, deixando a vida levar. Na semana passada eu tinha ligado pra uma outra pessoa atrás de "colo". Nada. Doeu miúdo aqui dentro. Um sentimento de que eu perdi, ou melhor, estou perdendo há tempos essa coisa bonita e misteriosa da amizade... Nunca achei que eu ia viver coisas no gerúndio. Muito menos a perda. Não dessa forma.
Eu nem sei exatamente o que eu fui buscar ali. Abraço, saudade, cumplicidade, risadas ou mesmo o resgate do meu lado nerd feliz. Não sei. Sei que saí de lá com vontade de escrever. Não sei o que, ou mesmo como isso aqui vai terminar. Mas tinha uma busca da Srta T que ia além dos olhos...
Quando eu estacionei o carro o João já vinha descendo e abrindo a porta... Como de costume a gente deu aquelas risadas gostosas... E eu desmontei chorando ali... Tanta coisa passou naquele choro, imagens, desapegos, decepções, sonhos desmontados, perdas e todas essas coisas que a gente não sabe traduzir mas que espremem a alma da gente...
Foi uma conversa gostosa com os meninos. A gente comeu pizza, tomou coca-cola e bebericou todas as histórias divertidas da nossa turma. Fazem 11 anos que a gente se conhece... eu ia aos poucos respirando aqui dentro e percebendo os caminhos que todo mundo tinha tomado. Quase igual ao poster dos Beatles que eu dei pro Jedi de aniversário... De vez em quando um carinho gostoso no pé e uma piadinha marota sobre o lacinho da minha sandália verde...
Quando eu finalmente resolvi ir embora a gente se sentou na porta da casa. Sabe aquela coisas de adolescente que quer conversar longe dos pais pra conversa não ser ouvida? Isso. Ficamos ali mais de 40 minutos tentando dar conta de toda a avalanche de mistérios que tomavam conta da gente nos últimos meses. Os medos, as descobertas, as revelações da gente, dos outros, dos amores, das decepções e dos desencantamentos do mundo que levavam a gente de volta pra dentro e depois pra fora. Não conseguia chorar ali. Só dizer da dor. Fiquei quieta. Escutei ele contar. A gente riu. Outro carinho no pé e um abraço desajeitado. conselhos e conselhos... cumplicidade dessas que a distância não precisa apagar. E as lembranças da escadaria do Teatro Municipal. Já são quase 5 anos...
Saí de lá mais leve e tomei o rumo de casa com essa sensação de não estar sozinha como muitas vezes eu penso - ou sinto - estar. Liguei pra casa. Nada novo. Uma conversa rápida por causa de um programa interessante na TV. Segui o caminho com as minhas minhocas no banco da frente. (O Jedi disse que elas tinham uma função bonita na minha vida... ainda não descobri qual é...) Entrei no supermercado, olhei aquele monte de prateleiras e procurei alguma coisas anti-tristeza... Nada. O supermercado é mais triste ainda. Cheguei em casa com o Juliano saracuteando beijos e amores e toda sorte de coisas de um sujeito feliz e apaixonado. Escutei ele falar. Do programa, do dia, das coisas todas que se passam ali com ele... E não tive vontade de dizer nada. Só de ficar com esse aperto no peito e deixar as minhocas cavarem mais aqui dentro, esperando encontrar sei lá bem o que...
E João! Olha só... que bom que a gente não se perde um pro outro, hein? Saudades cultivadas no coração...
Postado por Srta T às 9:03 AM 0 comentários