sábado, novembro 29, 2008

Ontem foi meu último dia no trabalho. E misturado a uma sensação de alívio e apego eu me vi ali, enfiada em mim mesma nesse monte de pensar e sentir e entender.

O mais mágico foi me lembrar - e sentir de novo - todas as coisas lindas sobre o último dia de aula. Como se fosse o fim de uma coisa muito importante da minha vida.Pixar camisetas, escrever bilhetes e dizer aquele monte de coisas (in)esquecíveis. Muitas daquelas assinaturas se apagaram e eu quase não me lembro de tudo... Mas a gente tem uma tendência a eternizar as coisas todas dentro da gente. Como se pudesse se agarrar o tempo com as mãos e colocar isso dentro do peito. Retocar as assinaturas, as pinturas dos retratos e corrigir os sons das conversas e despedidas, escutanto pra sempre.

Mas a memória é mais implacável... não se permanece como se quer. E que bom. Fiquei hoje cedo escutando Queen - who wants to live forever - e pensando no que seria a gente ficar assim, pra sempre, assistindo e vivendo a humanidade. O quanto a gente deixaria de ver o novo. De ser o novo. Essa palavra provavelmente desapareceria do nosso vocabulário. E eu queria entender porque ela sempre é tão necessária pra nós.

Ontem saí pelos corredores ritualizando em mim esse fim. Esse novo novo que se abre - e que ainda não sei onde está. Me lembrei do primeiro dia que entrei ali, naquela imensidão de prédios e ansiedade. Lembrei das entrevistas. Das frustrações da primeira fase. Do primeiro dia de aula. Lembrei do dia da saudação aos novos professores... dos que conheci. Dos aplausos que todos nós recebemos com a nossa chegada. Um auditório com quase 500 pessoas. E fiquei olhando naquela multidão quantos tinham saído para que entrássemos... quanta dor, desapego.

Olhei o sol se pondo no meio das árvores. As pessoas passando - sempre correndo - e sempre ocupadas. Olhei aquele encerrar de ano. Passei pelos corredores das salas de aula. Vi os que gosto, os que não. Olhei as salas vazias. Era um encerrar mais profundo pra mim do que o simples ano letivo. Vi as pessoas se aproximarem, falarem, inconformarem-se... Ouvi. Recebi abraços, bilhetes e até que chegasse naquele quiosque de festinhas e comilanças fui deixando o melhor de mim e levando uma coisa que jamais algum deles vai ter...

Recebi a gritaria dos alunos e aquele monte de pedidos de fotos, assinaturas de camisetas, ritos de passagem, de negação da ordem... Assinei me lembrando das assinaturas antigas. Daqui há alguns anos eles mal vão se lembrar dessas coisas, dessas pessoas, tãopouco das aulas. Tudo vira uma penumbra sem retoques no tempo. Olhei aqueles meninos e pensei o que eles vão ser daqui há 20 anos, onde estarão. Ah! se a gente soubesse. Eu não sabia há 20 anos atrás. Não via nada...

Ri bastante com os colegas e fotografei os bilhetes para mim. Olhei aquele clima de festa e notei que o ciclo estava de verdade encerrado. E isso me dava uma paz. Encerrei para eles, os alunos, não para a instituição. A máquina da instituição é insaciável. Nunca está bom. Mas para as pessoas, os alunos, há um saciar dado pela vida. Que não é saturação. Lembrei de muitos dos meus professores. Alguns mais, outros menos. Lembrei dos significados silenciosos de muitas das aulas. Das brigas e de tudo o que acontecia que parecia aos meus olhos a coisa mais importante do mundo. E de fato era. A diferença é que meu mundo foi se ampliando... ficou grande demais para aquilo.

Encerrei a minha participação. O mais difícil não é sair da vida das pessoas. Mas escolher o modo como se faz isso. A gente entra e sai da vida um do outro com a maior facilidade. Os relacionamentos são todos agora descartáveis. Um supermercado onde sempre o cliente tem razão. Deixei aquele lugar escolhendo quem levar comigo. Quem, de mim, deveria ficar comigo. Me despedi com alegria de todos eles. Levei as fotos, os bilhetes e todos os presentinhos.

Parti de um porto que não teria mais sentido. Que me enjaulava nessa vontade de sair e descobrir. Zarpei dali levando, nas bagagens especiais, um monte de lembranças e uma conquista minha, muito silenciosa. Não há paraísos mesmo. Mas constru-os aqui dentro, onde eu os possa levar.

E foi assim em cada classe.

E busco outros portos, menos barulhentos, onde eu possa ver mais o por do sol, escutando esse ir e vir das ondas, das gentes, de tudo o que a vida leva, traz, afunda no mar... e dissolve na água do tempo.

Um comentário:

Lou disse...

Muita saudade de você, de verdade, muita coisa para compartilhar.
Eu sei que vc já sabe, mas, de verdade, conte sempre comigo!
Fiquei feliz com o seu amadurecimento!
beijos
Lou