Nunca gostei de cebola. Tiro isso da pizza, da salada, até dos sanduiches dos trashfoods por ai.
Voltei há um mês exatamente. E essa volta me empurra mais pra lá do que pra cá. Fico tentando recompor as coisas dentro de mim e perceber o quanto mudou e o que ficou aqui dentro. Me sinto devastada por uma porção de coisas que não tem nome, que não sei explicar. E tudo vem assim, rápido e avassalador, quase num vômito.
Morreu muita coisa lá. Num "desastre de avião" mesmo. Joguei algumas da Thais sem paraquedas no meio dos oceanos. Sim, queria matá-las. As outras talvez tenham morrido por acidente e eu não tive a chance de resgatar nenhuma. Sorte a minha. Embora ainda tenham ficado alguns quase-luto.
A parte mais difícil de voltar é estar mesmo imersa no que eu chamo de realidade. Essa palavra tem ganhado cores e sons diferentes desde então. Mas talvez seja essa a mágica. Conversando esses dias me dei conta - finalmente - que o vivido foi mais que uma simples viagem de estudo, pesquisa e o escambau. Rito de passagem combinado com o fim do retorno de saturno? ai ai, me amedronta um pouco essa coisa ritualística toda... uma tentativa de encher de significado a minha crise de realidades? Poderia ser se eu não levasse em conta a sensação de morte aqui dentro. Olho pra trás e não me reconheço. É assustador.
Me sinto mais um monte de coisas e menos um outro tanto. Como se eu tivesse feito um regime para engordar e emagrecer ao mesmo tempo... e me vejo naqueles espelhos de parque de diversões. Tem sido divertido provar roupas e ver que elas não servem mais. Ontem tentei explicar ao Juliano que a mulher dele estava diferente. Mas o desafio disso é que por enquanto só eu vejo essas coisas. Acho que ele - e os demais - ainda veem as falecidas na minha frente. Ficaram no mar. Mas eu entendo. São tantas as mortes que ainda não deu tempo de contabilizar as vítimas aqui. Pior que acidente comum e assassinato premeditado.
Fiquei tentando mostrar quem tinha morrido. Expliquei. Mas acho que ele ainda não vê a diferença. Há uma porção de coisas que eu não quero mais. E isso me liberta de sentir medo, porque - de verdade - eu posso controlar quem eu quero que entre aqui. Alívio... e uma sensação de um carinho no coração. De não exposição... de fim. sem luto...
E aí me vejo sentada a essa hora da manhã com uma pilha de coisas pra fazer... tentando descascar cebola. Chorando e descobrindo nisso a beleza do que há por dentro. Que eu sempre tinha me recusado a ver. Arrancando a pele feia, murcha e escurecida. Jogando fora coisas que eu não queria mais ver, nem sentir. Mas como toda pele arrancada, dói. E vejo maravilhada essa coisa toda brilhando, lustrosa. Me enchendo de orgulho de ser o que eu sou. E ter o que tenho. Que na verdade é só meu mesmo. E que ninguém tem acesso. Semi-escondida pro mundo, descascada devagar. E aí o sentir-se solitária foi mais prazeiroso que antes. Foi um desapego de tanta coisa e tanta gente. Amassados nas cascas destroçadas pelo meu desprendimento. Mutilados com uma faquinha pequena, de pouco corte. Extirpando as manchas de antes. As imagens dos outros estampadas nessa pele quase sem lustro. Secando as dores que esfarelavam com o movimento das mãos.
E volto, e arranco. Tiro todos os pedaços cuidadosamente. Chorando. Me vendo. Sentindo esse cheiro entranhado nas mãos. Nascendo.
segunda-feira, agosto 31, 2009
descascando a cebola
Postado por Srta T às 6:44 AM
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Um comentário:
oi tuca, é verdade, ainda nao percebi esse novo eu que chegou de chicago, mas me torno mais receptivo a ele na medida em que tu o apresenta. estou curioso para conhece-lo melhor. te amo
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