terça-feira, maio 22, 2007

Little miss sunshine

Filmes. Mais um desses que te tocam o espírito com os 10 dedos, te denunciando as coisas mais sublimes que ainda mascaramos.

Sábado à noite. Sexta à noite... e eu estava particularmente sensível com a semana toda. Cansada. Queria ver um filme cheio de poesia, que me sinalizasse que a vida seria - e é - mais do que a gente consegue ver, mesmo não olhando diretamente nos olhos dela.

Little miss sunshine é um desses que deixam dias sentindo, lembrando... e pensando. Uma história que tinha tudo para ser piegas, ridiculamente narrada e cheia de chavões. Nada disso. O filme te atravessa o tempo todo, e mesmo os que são mais turrões não deixam de se emocionar com ele. Uma família cheia de poréns, como todas as famílias, assistindo de longe mesmo os sonhos de uma menina. Distantes de si mesmos e daquilo que achavam que tinham deixado pra trás há muito tempo. É uma redenção...

A pequena miss e aquela combe amarela, com gente maluca, lamentando a própria existência e ansiando por viver uma coisa artificial... Pois bem, me lembrei da minha família, de quem às vezes eu senti vergonha, quis ir embora, me distanciar. Engraçado como a gente se identifica ali de quando em vez com um e outro personagem. A narrativa é acolchoada nesses sentimentos. Mais do que identificação, você sente com eles... a frustração. O medo. E a superação no seu sentido mais sublime. Deixar ir embora aquilo que, de fato, não nos diz respeito.

Chorei em muitos momentos. Especialmente o da conversa do tio e do sobrinho olhando para o mar. Chovia. Ventava muito e nada ali parecia particularmente poético. Nem mesmo o motivo pelo qual eles conversavam. Mas era exatamente aí que residia toda a mágica discreta, envolvente... Você encontra poesia justamente onde os nossos olhos treinados não depositam crédito.

Fiquei me recordando de coisas que eu queria ter feito, ter sido. Ter vivido. Tanto... E ali, olhndo à beira do mar, você percebe que tudo o que você tem, de fato, é o que você é. Portanto o desafio não é ter mais. É ser mais. Constantemente, você. Esquecer e se desapegar. E só. O resto, vem, com paciência. E atenção para perceber esses pequenos milagres. Esses deslizes poéticos nas fraquezas, a redenção de si mesmo. A coragem de se olhar, se expor. E ver-se diante dos palcos, exibindo o nosso lado mais criança. Mais ridiculamente autêntico.

Depois de atravessar kilômetros angustiantes - e emocionantes - naquela combe amarela o destino final era uma beleza que não estava fora de ninguém. A criança, além de ser a única saudável ali, lúcida, percebia as idiossincrasias demoradas de cada um. E, amorosamente, os trazia de volta. O detino da viagem e o vencedor do concurso - eles mesmos...

Acho que ao final do filme, quando a família inteira dançou com a pequena, todos ali, de alguma forma, entenderam que há mais coisas que valem a pena do que o nosso esforço. Fiquei me lembrando de uma frase do Juliano sobre um ditado zen... que quanto mais a gente se esforça, menos a gente consegue. Ora, é exatamente isso que o filme atacava... perdedores e vencedores do que mesmo? para quem?

Invejei a menina. Quis dançar como ela e me lembrei das vezes que consegui esse desprendimento. Essa sensação de liberdade de mim mesma, dos meus cadáveres interiores que apodrecem, mas insisto em preservar aqui dentro. De algum modo, não sei como essa poesia voltou a habitar a minha casa. Como dizia a Dani, a gente não pode ter medo de ser ridículo... e que alívio isso! Dormi em paz. Senti que as feridas paravam de arder à medida que eu me desapegava dessas pequenas - e falsas - frustrações. Senti saudades de casa. Das vezes todas que meu pai pagava um mico e minha mãe ria dele. Nem sempre eu conseguia rir das coisas que a gnete fazia. Eu era, de vez em quando, a mais séria... e outras a mais subversiva.

Fiquei com vontade de voltar a dançar nesse concurso de miss da vida. Missing muita coisa.

Nenhum comentário: