Domingo cedo... Depois de uma noite de pesadelos e sono mal dormido aquele sufocar do peito me tirando de mim e me lançando sei lá pra onde. Fiquei horas na cama depois entre o odiar e o chorar. Sonhos ainda são poderosos demais nisso... Depois daquela convulsão de sentir e pensar e desistir aparece a gatinha no colo...
Custei para acreditar porque passei quase um mês num persuadir diário para termos mais um felino em casa. Mais um porque a leonina aqui é bastante territorial e espaçosa na casa dela.
O bichinho chegou assustado, com sede e uma fominha generosa. Fiz um rápido tour com ele pela casa pra dispersar esse estranhamento territorial. Afinal, felinos se ajudam também. Ficamos nos olhando por uns momentos e achei que eu poderia desabafar ali as minhas dores. Era engraçado. Fiquei imaginando o que aquela gata fazia na porta do prédio abandonada - ou fugida. Me identifiquei nesse abandono... nesse deixar-se pra lá. Coloquei um pote com água e fiquei esperando a sua reação. Minutos depois eu percebi que o problema era outro. Aquela fominha por certo estava ficando maior que ela. Abri a geladeira - depois de consultar bases confiáveis - e descolei um bifezinho cru. Ela comeu depressa e esperou com os olhos pedintes para que a porta da geladeira se abrisse de novo.
Enquanto comia eu pensava num nome. Nome de bicho de estimação tem que ser curto, mas bacana. Até então eu achava que era um gato. Fred. Em homenagem ao meu padrinho e à grande voz do Queen. Achei graça dessa comparação, afinal, nenhum deles estava mais aqui comigo. Só as suas lembranças.
Passei uma tarde gostosa com ela fechando os trabalhos e as notas dos alunos. Mais de 300 e eu pensando na Virada Cultural, no meu choro. Na última sessão de terapia e nas coisas que eu queria apagar da minha vida.
Depois me ocorreu uma coisa boboca de tudo... Lembrei do seriado Early Edition (que certamente me inspirou outra paixão platônica pelo Gary e seu gato e seu jeito de salvar o mundo)... Era a série que o gato trazia o jornal do dia seguinte. Fiquei fantasiando que alguma coisa ali vinha pra mim - ok, não um jornal com as notícias adiantadas, mas quem sabe algumas pistas para como ser feliz, resolver as crises existenciais, como terminar sua tese de mestrado, aguentar o tranco no trabalho, etc. Parei. Me dei conta que essa fantasia de um gato-oráculo me traria mais frustração. A gente se olhou muitas vezes nessa tarde. Meio perguntando quem-é-você-e-o-que-faço-no -seu-espaço... Bacana.
Fui me apegando. Sentindo esse carinho crescer. Uma realização de criança de ter um bicho de estimação... me lembrei de quando eu trouxe a malu - a gata perdida da escola - para casa, dentro da mochila. Depois de ter me arranhado horrores tentando dar um banho na pobrezinha (no tanque gelado de casa! SIM!) e trancafiado ela na mochila ouvindo as aulas de matemática e tentando bancar a defensora dos animais pra minha mãe... fiquei sem gato. Bom pra ela, ruim pra mim.
Ouvi o Juliano me avisando pra não me apegar... e eu - nada secretamente - torcendo para o dono (cruel!!!) dela não voltar. Ontem descobri que a Lina - exFred é menina mesmo. Foi legal reconhecer esse felino-feminino dentro-fora de mim. Me apeguei. Fiquei, deixei ela se instalar na casa como cúmplice dessa catarse de transformações. Eu precisava de uma testemunha. Ficamos brincando de noite com essas bobagens amarradas nas cordinhas. Foi ótimo. Deixei o lado infantil voltar pra deixar a tristonha-desapontada na janela. Olhando pra algum lugar fora dela mesma.
Voltei pra casa ontem esperando ouvir esses miados. Outra noite de pesadelo e sono nada dormido. Vigília e gratidão... Tinha mais gente ali do lado da cama dizendo que tudo ia ficar bem...
terça-feira, abril 29, 2008
Sinais
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domingo, abril 27, 2008
procurando por mim
Passei dias de respiro, suspiros de saudades de mim mesma...
Fiquei com essa sensação de ser desafiada-contestada-enganada e mais, sem revidar. Fui tomar sol no sábado. Peguei o carro e andei pelas ruas do Mackenzie, saudades do colegial. Passei por perto da casa do Rogério, Ju, tantas lembranças ali.
Reencontrei uma antiga professora numa loja. Falamos de roupas, de USP, da História, de várias histórias que passaram por nós. Lembrei de novo do Vinícius. Deu saudade dele. Das tardes debaixo daquela árvore e das conversas perdidas. Queria saber dele.
Falei pra mim mesma desse novo começar aqui dentro, no meu arredor mais perto. Do peito. Do tato, da boca. Fui buscar o Juliano nesse lugar bacana que ele encontrou. Cheio de histórias do porvir. E que vem, devagarinho no Nosso. deixando ele nessa espera-paciente-budista que custa caro no dia de hoje.
Andando por ali e por aqui recebi uma foto minha que (por acaso?) mostraram exatamente onde estou. No gargalo de mim. Saindo (ou entrando) nesse buraco? Ou será que essa janela escancarada de mim e dos outros, sem vidro, cheia de vento e sol, ruído, poeira e um libertar-se sem preço por essas esquinas de céu que eu venho buscando...?
Vontade de pular. De esperar. De sair. E de entrar para não mais sair...
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sexta-feira, abril 25, 2008
Saí pra ver o dia... sentir o sol no rosto e dar vazão a esse respirar de dentro. Há um adormecer meu aqui dentro. Cheio de rabiscos e cicatrizes mas com essa esperança se acendendo...
Lavei o pus... Saí olhando as coisas em volta do meu bairro. é bom ver gente na rua e sentir essa coisa de pertencimento. Sinto esse lugar meu. Sei os cheiros, as cores, esses ruídos e as conversas de portão. Foi bonito nessa semana surtada de trabalho sentir o coração reconfortado com esses quadrinhos de gibi em volta de mim.
Tenho me dado esses presentes. Do silêncio. Da solidão mesmo. Tenho preferido ficar quieta, em mim, cheia de mim, plena de mim. Tenho observado os meus espaços, os meus desejos e lembrado de gente querida. Ontem saí com o meu padrinho no peito. Faz muitos anos que ele morreu. E não deixou saudade. Deixou uma cratera na minha vida que às vees finjo não existir. Passo pelas beiradas dela. E toda vez que essa plenitude e esse frescor me voltam na alma ele vem devagarinho junto. São todas lembranças felizes dele.Coloridas. Cheirosas e lambusadas. Como eu tenho visto no bairro.
Semana passada eu acho fui a Zafari, um supermercado gaúcho da minha infância no sul. Eu sempre ia com ele e com o meu avô. Foi bom me sentir de volta naquele universo de guloseimas e lembranças nas prateleiras. Coisas de um passado vivo, generoso comigo. Era como se eu me procurasse no meio das compras. Voltei pra casa meio dilacerada-inteira-metade-cicatrizando e era bom poder me sentir criança de novo.
Ontem fiquei com vontade de ir pra lá. Nunca achei que ir ao supermercado me desse essa sensação de me preencher de novo. Que os publicitários não leiam isso. Foram muitas coisas de alívio misturadas a um reencontro comigo. Em profundezas gostosas, cristalinas. Cúmplices de quem eu sou.
Fiquei com saudade de amigos de infância. Dos passeios no Parque da Redenção em que o meu padrinho me empurrava forte nos balanços pra eu pegar as nuvens. Nunca consegui, por mais alto que eu fosse.
Senti saudade das caminhadas em Capão da Canoa no fim do dia. Com aquela praia feia de ver mas tão linda de sentir. Havia tanto de mim naquelas areias. Tantas descobertas, decisões. Fiquei com vontade de ir a Porto Alegre me encontrar. Andar pela rua da Praia e tomar banana-split com a minha mãe nas Americanas. Fiquei com saudade do gabinete do meu avô cheio de livros de passarinhos e música clássica. Senti falta de quando a gente escutava Verdi e todos os românticos alemães. Hoje cedo saí de casa cantarolando o coro dos ferreiros de Nabuco. Ele adorava essa canção.
Cheguei no salão pra fazer as unhas com os olhos molhados e esse respiro saudoso e quente de saudades. É bom demais esse se sentir querido, amado, importante. Parte. Inteiro pra alguém.
Tenho montes de trabalho a fazer e essa sensação gostosa de pertencer e ser me foram devolvidas ontem. Tanto afago no coração. Saudade de uma parte minha que não quero qeu se vá. Uma vontade de extirpar esse câncer do coração... e deixar isso cantarolar de dentro de mim. Sem dor. Só amor. Só carinho.
Fiquei com vontade de dar isso ao Pedro, meu afilhado. De fazer ele se sentir parte-inteiro pra alguém. Ele tem 4 meses. E é como se eu o tivesse a vida inteira comigo. Uma mistura de porvir-saudade. Quero empurrá-lo no balanço pra ele pegar as nuvens. Nem que isso seja quando eu estiver lá...
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Cicatriz
Hoje pela primeira vez em muitos meses senti alívio. Um respirar profundo, leve, sem poeira nos olhos.
Senti naqueles olhos de profundezas a cumplicidade e o acolhimento. Depois de um percurso sem rumo, quase carpideira de mim, pude me ver sã. Inteira de novo.
O sentir tem mais mistérios que eu desconhecia... e senti saudade de mim assim. Intensa, inteira, minha de novo. Havia uma esperança ali. Depositada num silêncio e numa espera de alguma coisa em algum lugar. Tão vago mesmo. Mal sabia dirigir o carro e pudera, nem sabia pra onde voltar. Acho que dei umas voltas em mim naqueles quarteirões intransitáveis dos Jardins. Passei em alguns lugares - memórias esbranquiçadas, cizentas, desbotadas... e outras tão vivas. Recordei muita coisa.
Deveria sair sim com os olhos secos. E só então a imagem do espelho apareceu de novo. Engraçado como a gente se deixa turvar... quase acreditei no que diziam. E cheguei a sentir aquilo - forçosamente? - dentro de mim.
Senti uma vontade louca de escrever. Esse perdido de palavras sem sentido para qeum não me vê daqui de dentro. Textos confusos e uma catarse-emoção sem freio. Mas leve. Quis voltar para muitos lugares. Esquecer de muita gente. E nem saber de outras.
Fiquei dentro de mim. Pude rir, observar. Lembrar de um monte de queridos e de risadas soltas pelo caminho do meu coração. E aquele pisca todo de luzes impacientes dos faróis me deixaram um meditar. Olhei em volta no caos das avenidas e dos happy (será?) hours nas esquinas... um deixa pra lá. Me queria de volta só pra mim. Esvaziada.
E de repente me dei conta dessa cicatriz na alma. Que a todo tempo é esfolada aqui e ali... tantos silêncios e crenças. E me lembrei das profundezas de novo naquele convulsionar de chorar e pedir ajuda e desistir e morrer de dor... Fiquei com a cicatriz no peito, sem tapar. Nem rejeitar. Olhei nos olhos dela... e vi aquele repuxar de sentir, de pensar, de imaginar. De repulsar. E chorei de novo. Deixei de apertar. Pedi ajuda. Senti. E quase me despedindo, segui com ela sem querer chegar aqui... Olho em volta e vejo tudo tão cheio de história, de contos de fada e castelos por vir... Outros a gente deixou pra lá... Fiz tudo direitinho pra seguir adiante. E esse repuxo de sentimentos me acompanhando... e aos poucos percebendo que esse repuxo vinha dali, logo do outro lado da rua... que alívio poder cortar essa corda...
E nunca mais ter a sensação de que te estilhaçam por dentro, apesar das marcas. Da cicatriz dessa história minha, de outras, de tantas e tantos sentir e pensar e querer e largar e repuxar... Parei. Voltei a ser minha de novo. Sem cicatrizar... mas conseguindo me sentir ali.
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sábado, abril 19, 2008
Refluxos dentro de mim... quem dera se tivesse remédio de farmácia pra colocar isso pra dentro (ou pra fora) de uma vez.
Recebi esses dias um convite inesperado pra participar de uma conversa que me remexeu os nervos. O pior das sombras não é quando você as vê, mas quando as pessoas te trazem cada uma delas e insistem que você vê coisas.
Passei o dia com nojo. Sem querer falar nada. E mais, uma mistura de revolta de mim contra mim, e desse sentimento de alívio... "ah, até que enfim se percebe"...
Fiquei os últimos dias chapada com os remédios e mergulhei num lodo de lembranças e mágoas. Olhei no fundo. Havia muita dor ali e não havia nada a se fazer. Desespero completo e uma ansiedade que quase me fez sair correndo de mim. Fiquei me perguntando porque tanto choro. Tanta dor. Fiquei pensando o porquê de tanta insensibilidade. Egoísmo. Egocentrado. E antes que esse texto se torne um vômito desse lodo, cheio de refluxos desencontrados que se lambuzam nas dores, feridas, inflamações magoadas e repulsas de toda ordem eu respiro. E volto do mergulho desses remédios. Sem chão. Não sabia mais quem era, o que era aquilo tudo ao meu redor. As certezas e seguranças, os contornos humanos se perdiam nesse universo nebuloso de tantos personagens e mentiras e histórias e esperanças e omissões e controle e fugas e solidão e carência. Não sabia mais nada. Olhei, durante horas aquilo tudo. E aquela conversa da qual fui convidada a participar me provocou uma fúria de bixo ferido, acuado, abusado, desprezado.
E se eu pudesse ter feito o mesmo... Me peguei num trovão interior de pensamentos e vinganças... Nunca achei que meu lado mais feio pudesse falar tão alto aqui dentro. Crispei as mãos.
Olhava em casa e buscava por essas singelezas que esse cantinho pode me dar. Sinais, meus, dele, nossos, que geralmente suavizam essa angústia e acendem luz nesse buraco de sombras escancarados na alma. Fiquei olhando para as gavetas de novo. Quem estava mesmo ali? Esperei ouvir ele chegar. E deixar esse lodo decantar aqui dentro. Me acuei nesse colo. E tenho até medo de fechar os olhos. Para perder de vez. Fico respirando fundo. Ouvindo essas juras de amor, quietas, que são só pra mim. Procuro a cumplicidade desse crime de amar. E desse desajeito tão humano, que fere, se fere.
E a luz apagava aos poucos, o sono vinha desse monte de remédios pra essa dor nas costas. E eu queria ficar. E nunca ter ido. Nunca mais. Sem pensar. Sem mais refluxos que me deixam vomitar esse horror de tudo. Esse pavor de viver. E fiquei, esperei, rezei. E voltei.
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terça-feira, abril 08, 2008
Vontade de ir de mar, pra longe daqui.
Engraçado. Comecei a assistir de novo os episódios do Galática. Uma série que me encantou a adolescência na Sessão Espacial da Rede Manchete. Esse desejo deles de se encontrarem com os irmãos distantes depois de perder tudo o que tinham e toda a sorte de tragédias, aventuras, que acontecem durante essa viagem... isso sim, te dá vontade de ir.
Fico sempre admirando os heróis dos filmes. Para mim eles tem algo em especial que é acreditar nas pessoas e que as coisas vão se resolver no final. Isso sem falar das miraculosas soluções encontradas para sair das piores enrascadas.
Me deu saudades de um tempo em que eu acreditava mais. De ser ingênua, ter esperança. Senti falta da USP e dos tempos em que eu tinha alguns amigos bem mais perto. Fiquei uns 40 minutos andando na USP à noite e sentindo aquele cheiro de mato molhado nas árvores. Nem a árvore favorita eu vejo mais. Senti falta das épocas em que eu jogava RPG e tinha preocupações mais nobres com o futuro da humanidade. Me lembrei no caminho de volta pra casa com os vidros abertos na marginal do Persépolis e de como a gente vai se endurecendo por dentro.
O Rogério conversou muito comigo no sábado sobre esse movimento... a gente falou dos amores, das dores. Legal escutar ele falando dele. O Fábio tem essa outra mãozinha... me dá a sensação de ficar velha por dentro. De ter um outro brilho desgastado no meu coração - de sentir e continuar sentindo mais - mas sentir diferente.
O Rogério me perguntava se eu tinha amargurado. Não. Mas tenho cansado das pessoas que reclamam demais, inclusive de mim quando me via nesse papel. Eu perguntei pra ele se eu tinha mudado muito já que a gente se conhece desde os 13 anos. Ele riu. Tomamos algumas cervejas em silêncio dizendo aquele básico "ai ai" que silencia e traz todos os outros - velhos e novos - assuntos de volta.
Eu sempre fico feliz de ter os meus amigos por perto. Pra alguém com essas "crises existenciais" cheias de nostalgia e saudade de aqui, dali, de lá, é um jeito especial de não deixar de acreditar. Sem amargar... já que a vida é doce demais.
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"Há uma revolta na sua condição feminina". Essa foi, certamente nos últimos anos, a frase mais machista dita pra mim. Depois de quase dois anos estudando gênero e afins, sou assolapada por fim, pela maior - e mais dolorosa - das ferramentas acadêmicas: a sua própria vida pessoal.
Hoje seria uma noite especial pra sair e tomar um porre com o M. Foucault. Depois de (re)discutir a sua análise brilhante sobre a sexualidade humana na semana passada e passar meses lendo sobre as feministas... finalmente fui acusada de tal. E mais, sob o argumento da minha falta de solidariedade à (requentada e cristalizada) promiscuidade masculina. Me lembro agora de um dos textos de uma dessas feministas - como se diz - desenvolvendo seus argumentos sobre essa naturalidade da putaria masculina e como isso se transformou em enormes argumentos psicanalíticos, sociológicos, antropológicos, para não dizer históricos. Numa cervejada com o Rogério na clássica Braumeister, me recordo de uma fala nossa sobre a promiscuidade - também natural - das mulheres. Ora, no fundo isso sim é natural, talvez. Lamento feministas e machistas. Sim, todo mundo gosta de dar e de comer todo mundo. Quase o caos sexual que as teorias do patriarcado apresentaram no final do século XIX.
E quer saber o pior? Pelo menos a maioria dos moderninhos adeptos dessa "liberdade" sexual se dão conta que apesar da nossa tentativa modernosa - a modernidade nos trouxe de brinde no pacote do individualismo - o nosso profundo egoísmo em dividir. Não dá pra dividir quando se sente, muito menos quando se trata de dividir o outro. quanto a nós... nem sei se sobre algo nessa proposta emancipatória do compartilhar parceiros - tudo muito limpo, travestido de uma nova moralidade. Portanto, cuidado, se você acha alguém bastante moralista, atente-se para não estarem disputando a moral da vez.
Ora, o ponto não é esse. Discussões acadêmicas devem ser feitas apenas entre os especialistas. Vou deixar isso para as solidárias feministas que se lamentam todas de serem mulheres... ou de quererem queimar o sutien em praça pública... Ora essa, por favor! "Estou farta do lirismo comedido" repito o Bandeira... Mas deixemos de fato que os textos falem somente a quem os interessa. Sempre esqueço que as pessoas escolhem o que ler - e como ler. Há outros que se interessam apenas em justificar. Para o sim e para o não.
Fico pensando - e sentindo - muito mais esse clamor da necessidade de sentir. Por que, afinal, a gente quer que o outro sinta EXATAMENTE o que a gente sente? Ou entenda como isso deve ser sentido, doído. Fico aqui me lembrando dos clamores de solidariedade da "dificuldade de sentir" que se manifestam na falta de compreensão do outro, da dor, do dimensionar, de se colocar no lugar do outro, de falar, de dizer a verdade. E ainda, de colocar na mesa o que se entende por verdade. Talvez o agente Mulder esteja certo... a verdade está lá fora, em algum lugar absolutamente inatingível pra nossa completa - plena - falta de solidariedade com o outro.
Fiquei me lembrando das frases de todos os meus amigos - homens, supostamente machistas, mas nem sempre! - sobre as mulheres. Ora, as relações de gênero são mais complexificadas do que se pensa. Talvez a culpa - se é que existe - seja do próprio Foucault em anunciar ao ocidente que o que ele melhor sabe é discutir, sem resolver porra nenhuma. Transformar o sentir, o querer, em discurso arruinou completamente a nossa possibilidade de negociação. Aos meus amigos machistas - assumidos - devo dizer que conforta saber o lugar de onde se fala... facilita alguns entendimentos sobre a condição - estranha? - da amiga de vocês. Aos machistas - não assumidos - hmmm... talvez vocês devessem ler - já que apreciam a leitura e a discursividade dela - um pouco mais sobre o que se entende sobre feminismo, mulheres, etc. Essas "coisas" muitas vezes chamadas de "rótulos acadêmicos". (Acabo de me lembrar da Princesa Leia dizendo ao Han Solo, supostamente uma assumidade nas mulheres, "você não entende nada de mulheres") Às feministas: cuidado para não acharem que vocês são paranóicas (no sentido clínico!), lésbicas, ou ainda que odeiam homens já que são mal comidas. Pãtz... Às não-feministas: cuidado para não serem chamadas de moralistas, ingênuas, permissivas, submissas, silenciosas.
Aos perdidos... por favor, cuidem para não deixarem o sentir discursar demais. Outro cuidado: ao lerem, cuidem para quem vão falar de suas "descobertas" sentidas ou observadas. Viver tem um que de antropológico. O duro é que a tensão sujeito-objeto parte em mil pedaços essa coisa nossa - academicamente falando - chamada indivíduo.
Hoje me perguntaram se eu era juíza, advogado, vítima. Eu me pergunto depois se sou feminista - nessa pobreza dada do termo - ou machista (Lê-se moralista). E me lembro do Ney Matogrosso, do meu tio, dos meus amigos gays assumidos e não assumidos. Das amigas bem e mal comidas. Dos casais que eu sempre escuto terem problema de relacionamento, que insistem em ficar casados reclamando nas festas dos seus casamentos. Me lembro do Juliano rindo de mim porque eu "adoro discutir a relação", me lembro dos namoricos do colégio, das paqueras. Me lembro dos meus pais. Dos meus sogros. E me dou conta que qualquer coisa que eu diga agora, depois, pra quem for, será apenas, e só, somente isso, o meu partucularíssimo ponto de vista. Assim como os outros milhares de pontos espalhados nessas relações, olhares, sentires, que talvez não formem retas, planos. Não formem porra nenhuma na teoria do caos, dos jogos...
Ea talvez, bem possivelmente, o que me reste nesse desabafo "feminista", revoltado com a minha "condição feminina" - que pena isso... - seja apenas a leitura dos textos e as boas cervejadas com os amigos (nada) machistas... e o final eu publico quando a tese de viver terminar.
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terça-feira, abril 01, 2008
Há um mistério no convívio da dor com o amor. Uma coisa aguda aqui dentro que, ao invés de me jogar pra dentro, me atira pra fora. Pra ele.
Passei o domingo cozinhando coisas aqui dentro. Pura fermentação de talvez, se, quem sabe... Num passeio pelo bairro e pela feira, depois de tirar fotos, falar, chorar, explicar, entender, perdoar. Finalmente, se lançar. Ontem dizia para uma amiga que eu não conseguia entender essas sutilezas de um e de outro.
Cheguei em casa depois da maratona trivial da 2a. feira. Conversamos. Matamos o restinho do vinho que tínhamos aqui. Silenciamos. E de repente algumas coisas se derretiam nos carinhos, nos olhares e nessas conversas de fim de dia. Meio "o que você fez de bom hoje?" e tal. Descomprimissados com a dor, com o aperto.
Acho que é isso que o Nosso tem de mais mágico. Essa capacidade alquímica de nos devolver o que mais amamos um no outro. O tempo todo. Mesmo que atrasando as nossas (infantis) expectativas.
No mistério, me devolvo...
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