"Há uma revolta na sua condição feminina". Essa foi, certamente nos últimos anos, a frase mais machista dita pra mim. Depois de quase dois anos estudando gênero e afins, sou assolapada por fim, pela maior - e mais dolorosa - das ferramentas acadêmicas: a sua própria vida pessoal.
Hoje seria uma noite especial pra sair e tomar um porre com o M. Foucault. Depois de (re)discutir a sua análise brilhante sobre a sexualidade humana na semana passada e passar meses lendo sobre as feministas... finalmente fui acusada de tal. E mais, sob o argumento da minha falta de solidariedade à (requentada e cristalizada) promiscuidade masculina. Me lembro agora de um dos textos de uma dessas feministas - como se diz - desenvolvendo seus argumentos sobre essa naturalidade da putaria masculina e como isso se transformou em enormes argumentos psicanalíticos, sociológicos, antropológicos, para não dizer históricos. Numa cervejada com o Rogério na clássica Braumeister, me recordo de uma fala nossa sobre a promiscuidade - também natural - das mulheres. Ora, no fundo isso sim é natural, talvez. Lamento feministas e machistas. Sim, todo mundo gosta de dar e de comer todo mundo. Quase o caos sexual que as teorias do patriarcado apresentaram no final do século XIX.
E quer saber o pior? Pelo menos a maioria dos moderninhos adeptos dessa "liberdade" sexual se dão conta que apesar da nossa tentativa modernosa - a modernidade nos trouxe de brinde no pacote do individualismo - o nosso profundo egoísmo em dividir. Não dá pra dividir quando se sente, muito menos quando se trata de dividir o outro. quanto a nós... nem sei se sobre algo nessa proposta emancipatória do compartilhar parceiros - tudo muito limpo, travestido de uma nova moralidade. Portanto, cuidado, se você acha alguém bastante moralista, atente-se para não estarem disputando a moral da vez.
Ora, o ponto não é esse. Discussões acadêmicas devem ser feitas apenas entre os especialistas. Vou deixar isso para as solidárias feministas que se lamentam todas de serem mulheres... ou de quererem queimar o sutien em praça pública... Ora essa, por favor! "Estou farta do lirismo comedido" repito o Bandeira... Mas deixemos de fato que os textos falem somente a quem os interessa. Sempre esqueço que as pessoas escolhem o que ler - e como ler. Há outros que se interessam apenas em justificar. Para o sim e para o não.
Fico pensando - e sentindo - muito mais esse clamor da necessidade de sentir. Por que, afinal, a gente quer que o outro sinta EXATAMENTE o que a gente sente? Ou entenda como isso deve ser sentido, doído. Fico aqui me lembrando dos clamores de solidariedade da "dificuldade de sentir" que se manifestam na falta de compreensão do outro, da dor, do dimensionar, de se colocar no lugar do outro, de falar, de dizer a verdade. E ainda, de colocar na mesa o que se entende por verdade. Talvez o agente Mulder esteja certo... a verdade está lá fora, em algum lugar absolutamente inatingível pra nossa completa - plena - falta de solidariedade com o outro.
Fiquei me lembrando das frases de todos os meus amigos - homens, supostamente machistas, mas nem sempre! - sobre as mulheres. Ora, as relações de gênero são mais complexificadas do que se pensa. Talvez a culpa - se é que existe - seja do próprio Foucault em anunciar ao ocidente que o que ele melhor sabe é discutir, sem resolver porra nenhuma. Transformar o sentir, o querer, em discurso arruinou completamente a nossa possibilidade de negociação. Aos meus amigos machistas - assumidos - devo dizer que conforta saber o lugar de onde se fala... facilita alguns entendimentos sobre a condição - estranha? - da amiga de vocês. Aos machistas - não assumidos - hmmm... talvez vocês devessem ler - já que apreciam a leitura e a discursividade dela - um pouco mais sobre o que se entende sobre feminismo, mulheres, etc. Essas "coisas" muitas vezes chamadas de "rótulos acadêmicos". (Acabo de me lembrar da Princesa Leia dizendo ao Han Solo, supostamente uma assumidade nas mulheres, "você não entende nada de mulheres") Às feministas: cuidado para não acharem que vocês são paranóicas (no sentido clínico!), lésbicas, ou ainda que odeiam homens já que são mal comidas. Pãtz... Às não-feministas: cuidado para não serem chamadas de moralistas, ingênuas, permissivas, submissas, silenciosas.
Aos perdidos... por favor, cuidem para não deixarem o sentir discursar demais. Outro cuidado: ao lerem, cuidem para quem vão falar de suas "descobertas" sentidas ou observadas. Viver tem um que de antropológico. O duro é que a tensão sujeito-objeto parte em mil pedaços essa coisa nossa - academicamente falando - chamada indivíduo.
Hoje me perguntaram se eu era juíza, advogado, vítima. Eu me pergunto depois se sou feminista - nessa pobreza dada do termo - ou machista (Lê-se moralista). E me lembro do Ney Matogrosso, do meu tio, dos meus amigos gays assumidos e não assumidos. Das amigas bem e mal comidas. Dos casais que eu sempre escuto terem problema de relacionamento, que insistem em ficar casados reclamando nas festas dos seus casamentos. Me lembro do Juliano rindo de mim porque eu "adoro discutir a relação", me lembro dos namoricos do colégio, das paqueras. Me lembro dos meus pais. Dos meus sogros. E me dou conta que qualquer coisa que eu diga agora, depois, pra quem for, será apenas, e só, somente isso, o meu partucularíssimo ponto de vista. Assim como os outros milhares de pontos espalhados nessas relações, olhares, sentires, que talvez não formem retas, planos. Não formem porra nenhuma na teoria do caos, dos jogos...
Ea talvez, bem possivelmente, o que me reste nesse desabafo "feminista", revoltado com a minha "condição feminina" - que pena isso... - seja apenas a leitura dos textos e as boas cervejadas com os amigos (nada) machistas... e o final eu publico quando a tese de viver terminar.
terça-feira, abril 08, 2008
Postado por Srta T às 12:05 AM
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