terça-feira, julho 15, 2008

Sempre gostei de trilhas sonoras de filme. Há tempos que eu venho descobrindo John Williams. Sempre que uma trilha me toca fundo, a música é dele. Assisti Memórias de uma Gueixa há um pouco mais de 2 anos. No cinema. Na época que vi o filme, por recomendação do Tomas e do vinícius, eu tinha que enfrentar uma coisa que me corroía a alma. De antes? De sempre? Dessas descobertas que a gente faz da gente e do outro que, ou põe tudo a perder, ou se ganha para sempre.

Acho que o resultado tem sido o segundo. Esses dias consegui a trilha do filme e passei o dia corrigindo as provas, correndo aqui e ali com material de construção, vendo gatos, com essa música na casa. Fui lançada àquele fim de tarde de 2006. Antes da Páscoa. E me descobri ali, quieta por fora, agonizando por dentro. E me lembrei que a personagem era como a água. Atravessava e se moldava às coisas. Tinha essa virtude de seguir, sem se amedrontar com os buracos e curvas. Invejei. Desde aquele dia não consegui reproduzir esse deslizar. Escorrer.

Na verdade, tenho cavado mais fundo, mas sem deixar a água entrar. Lembro bem que um amigo me disse que as minhocas vivem em lugares úmidos. Mas não submersos. Fiquei com vontade de ser essa água. Ontem, lendo o livro Amor em minúscula com a trilha do filme, me dei conta que eu ainda não consegui lavar esses buracos aqui dentro. Há pouca luz. E ainda por cima os escondo com panos cintilantes para disfarçar.

Voltei a ter insônia e não dormi essa noite. Invejei os gatinhos que pulavam pra cá e pra lá. E eu rolava inquieta. Sem poder dormir. Sem poder acordar. Havia um silêncio pré-tempestade dentro de mim. Fiquei com as memórias. Não as minhas. Dele. E me confundi. Me perdi aqui dentro nesse novelo de lembranças picpotadas em cadernos e frases perdidas. Fora do contexto. Sem texto que me dissesse respeito. E a dor... esperando no pé da cama. Ouvindo o meu respirar apertado. Nervoso. E de repente, sobressaltada pelo pulo do Fred na cama que me olhava fixamente, achei irônico me encantar com as memórias dos outros. Sempre tristes, dizia o Juliano. E me apertei mais em mim. Vi um desfile sombrio de rostos e curvas de pessoas. Cores e tamanhos que se confundiam com esses fantasmas aprentados pra mim. Não dormi mais.

Apertei a boca nas mãos pra conter esse respiro. Senti uma pontada no peito e uma vontade louca de me esquecer. De tudo. De nunca saber. O desconhecido pode ser mesmo um grande abençoar. E chorei mais. Me desesperei nessa vontade de me apegar mais, mais. De querer. e de ouvir e saber... sem mais ter que ler...

Não me lembro mais de ter dormido, mas fui sacudida pelo despertador do Juliano que ia viajar cedo. Mais panos. Menos cintilantes. Como a gente pode mesmo sublinhar essas emoções com música? Fiquei pensando nessa coincidência de ouvir de fora, de dentro, desse mundo cheio de memórias. Dessas que se quer esquecer, dessas que se apertam no coração e entre os dedos para não escapar. Dessas que se pode perdoar. Mas não se pode.

Lembrei de mais um monte de coisas hoje cedo. Quase nostalgia de 28 anos que ainda não se foram? Me senti velha. Jovem. Inteira. Fractal. Pensei e deixei de pensar. Fui fazer essas coisas do cotidiano e meio para fazer de conta que se está bem por dentro, comecei a falar e a falar. Com gatos. Resolvi problemas da obra e não tive vontade mais de sair de casa. Fiquei aqui. Atirada no meio das provas. Ouvindo a mim. E pedindo ao John Williams que sublinhasse essas outras coisas aqui que eu ainda não sinto, nem percebo, mas existem dentro de mim. Pedi música. Perdi memórias. E me deixo com votade de ter mais esquecimentos e lacunas... pra deixar a água passar.

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