terça-feira, agosto 08, 2006

(des)filando

As minhocas de novo.
Esse fim de semana elas até que se comportaram bem, com exceção de sexta-feira. Elas me cansam demais. Sábado aprontaram de novo e eu fiquei com aquela cara de idiota pra mim mesma pensando que mais uma vez elas tiveram a chance delas. Droga!

Não tem sido fácil. Especialmente porque as minhocas revelam a minha enorme insegurança diante da vida. Brincam com isso o tempo todo e fazem confirmar as suas profecias. Dá medo mesmo. Não é pela aparência gosmenta, suja e feia delas (embora isso contribua!), mas talvez o fato delas não terem rosto. Isso sim mata. E nem sei quem são as minhas (ini)amigas... dificultando um bocado a minha batalha diária com elas. O pior é que elas se travestem de tudo, dos mais próximos e amados, aos mais distantes, longínquos, indiferentes, desconhecidos.

Ontem à noite, depois de levar as minhocas ao centro espírita e passar o dia com elas me dei conta que essa talvez seja uma batalha perdida. A questão é que elas se movem o tempo todo em mim. Isso incomoda. Assusta. Está absolutamente fora de controle. Enfim...

Mas dizia do meu dia com elas. De fato elas mostraram uma utilidade e tanto ontem. Companheiras de fila. Eu detesto filas, qualquer uma. Fui ao cartório e ao banco, lugares clássicos de filas. Normalmente as pessoas estão com aquela cara de "estou na fila". Essa cara é indescritível pelos adjetivos tradicionais. Não se denomina. Algumas pessoas liam, outras reclamavam, brigavam, algumas outras dançavam com os seus fones da moda nos ouvidos (um amigo meu dizia outro dia que depois do Ipod, os fones de ouvido tinham entrado na moda, eram todos branquinhos... - um jeito semi-discreto de dizer que você tem um, embora de fato talvez não tenha). Estava quase com essa cara de fila e aí me dei conta, surpreendida, que todos ali tinham minhocas. Elas foram timidamente saindo do escurinho dos cabelos, dos ouvidos, dos olhos... dos fones de ouvido (essas eram ao menos mais dançantes)... Meu Deus!! Eu não pude me conter!! Só dava eu abrindo um sorriso na fila (na certa ninguém entendeu nada, afinal fila não é um lugar de riso!)

As minhocas começaram a sair dos seus esconderijos e eu via todas. Até os atendentes tinham as suas. As minhas ficaram particularmente orgulhosas porque eu tinha enfim, percebido que a humanidade das filas era povoada por minhocas alheias. Foi mágico. Elas esboçavam na sua ausência de rosto, um pequeno sorriso de gratidão. Retribuía. As minhas minhocas ficaram super agradecidas, afinal eu tinha trazido as suas companheiras pra fora , ou melhor, percebi que elas não eram exclusividade minha (afinal, não mereço tanto assim, elas diziam). O mais estranho naquele momento é que eu senti, mais uma vez, pena delas. Eu não sei explicar bem como é isso. Se é pena mesmo, afinal elas estão sozinhas cons(m)igo mesmas. Não me recordo nas nossas conversas delas mencionarem vizinhos, colegas de quarto, parentes, etc. Por outro lado, ficam sempre na cola dos seus hospedeiros. Não sei se elas chegam a ser parasitas. Não é bem isso. Ontem à noite o Juliano, me dizendo sobre um texto que tinha escrito aqui, repetia que prefere quando eu não tento explicar as coisas demais, resolver o mundo, etc. Às vezes sinto que essa é uma condição minha, de existência, não de escolha.

Mas voltando às minhoca(çõe)s. Eu dizia das filas. Da espera. De fato as minhocas são as grandes companheiras de espera. Não sei se dos demais, mas minhas certamente. Elas ficam sussurrando pra não deixar o silêncio tomar conta. Imagno que elas pensam que tenho medo do vazio. Eu tenho sim, mas nunca o experimentei. Elas nunca deixaram. Me enchem a cabeça de imagens que só elas podem criar. Acho que são inimigas do Sandman. Elas destroem todas as minhas construções bonitas de sonhos, os subsituem por ruínas, escombros. Gente morta. Por que isso? Por que elas são tão amargas assim? Algum sentimento de vingança comigo?

Em homenagem ao Juliano não vou ficar explicando. Nem tentando.

Levei as minhocas para tomar um passe depois, mais à noite. Acho que elas ficaram fragilizadas por essa energia. Não tem sido fácil lidar com elas. Não é à toa que o Juliano está cansado. Não mesmo. Eu não aguento mais. Elas reagiram ontem. De forma humilde. Ao menos deixaram que eu colocasse exposta a minha insegurança pela presença delas. Mas isso parece assustar ainda mais os que me rodeiam? Será que é porque percebem que eu não dou conta delas sozinha? Que eu tenho medo? Vou tentar não explicar...

Eu só queria descobrir um anestésico. Algo que as deixassem dormir um pouco para que eu pudesse falar mais com o meu coração. Às vezes sinto que elas já tomam conta dali. Dói. Sufoca. E eu não sei mais como agir. Algumas vezes sinto que a anestesiada sou eu, vendo um monte delas desfilando na minha frente, enquanto eu olho, parada, com a cara de fila deixando que elas falem por mim. Vivam por mim. E até sintam por mim.

Um comentário:

Trovador disse...

Este seu escrito me remeteu a um livro que ando lendo:

"Somos vasta legião de combatentes em vias de vencer os inimigos(minhocas?) que nos povoam a fortaleza íntima ou o mundo de nós mesmos, inimigos(minhocas?) simbolizados em nossos velhos hábitos de convívio com a natureza inferior(afinal elas são gosmentas), a nos colocarem em sintonia com os habitantes das sombras(minhocas ou tatu?), evidentemente perigosos ao nosso equilíbrio."

rsrs brincadeiras a parte, e interessante pensar o quanto estamos sempre atentando contra nosso equilibrio não?

beijos doces...