segunda-feira, março 12, 2007

continuando o bush

Segue o comentário do Jedi...

Tá me fazendo repensar os pontos de vista... as sensações de estranhamento... Mas insisto. Acho que ainda temos uma dificuldade - esquizofrênica - de olhar por fora de nós mesmos. Me pergunto. Há outra possibilidade? Ou a sociedade é só nosso laboratório de sentir e experimentar. To pensando como unir o que há aqui dentro com o que há aqui fora... Ou se essa fronteira de mundo"> é de verdade... ou pura ficção.


Acho que valeria um chopp com O Jorge Grespan e com o pessoal. Isso é hermenêutica?



Jedi,

Estenda essas palavras ao seu blog, se você assim o
desejar. Escrevi em cerca de cinco minutos,
velozmente, e não vou fazer revisões. E não revisarei
– por incrível que pareça – por respeito a quem for
ler...

Começo com suas próprias palavras: “Não havia nada ali
de mais profundo. De verdadeiro ou genuíno. Eu estava
num curso de ciências humanas e via a ausência de
humanidade ali”. Concordo com a desumanidade, num
sentido bastante elástico, mas discordo de não ser
genuíno: aquilo tudo foi verdadeiro sim! A
desumanidade que você enxergou, o despropósito, as
contradições e paradoxos são marcas profundas do viver
em sociedade atualmente, e elas estavam presentes e
evidentes naquelas circunstâncias e espaço. Vivemos
numa cidade em que uma universidade pública está
cercada por muros e portarias com vigilância. Em
primeira instância, deveria ser assustador. Mas não o
é. A cidadania, o espaço público, os direitos e
deveres e toda uma parafernália que herdamos do
liberalismo europeu estão dando chabu há muitos anos,
mas o princípio de tudo isso é sempre o mesmo: os
modernos seres humanos, em primeiro lugar – depois os
cidadãos – estão dando chabu há tempos. Pense comigo:
o que eu mais ouvi nos ônibus e nas ruas (sim, ando
bastante de ônibus e ando um monte pelas ruas) é que a
vinda do presidente de outro país atrapalhava o
acontecer da cidade. Todos se preocupavam com o
trânsito, com o possível atraso nos mini-compromissos
dos micro-egos, com a mudança temporária operada no
espaço urbano por uma visita AUTORIZADA PELO GOVERNO
BRASILEIRO, eleito inclusive pela população da cidade
que parecia protestar. Ouvi do cobrador de um ônibus –
coisa rara em São Paulo: ele olhava nos meus olhos
enquanto falava (já sabemos o que isso significa, em
muitas dimensões, certo?!) – a seguinte frase: “o cara
vem aqui, pensando que manda no mundo”. Que ele estava
aqui, já sabíamos; que ele pensa que manda no mundo,
nós também já sabemos; no entanto, a que “mundo” ele
se referia? Me peguei sem resposta. Em que medida
podemos chamar o que experimentamos de “mundo”, senão
na dimensão individual? Vivemos numa cidade em que o
trânsito complicado é um problema naturalizado: quando
um elemento externo surge para complicar uma condição
intrínseca, nós sagazmente direcionamos o problema
para fora. A descrição em psicologia para o fenômeno
por meio do qual o indivíduo não consegue conectar-se
com a consciência de si é “esquizofrenia” (apesar de,
tecnicamente, jogar o problema para fora também
envolver uma afrodisíaca dose de sublimação...).
Quando isso acontece com grupos, comunidades,
multidões, cidadãos, qual o limite? O céu?

Nossa experiência social é genuína, verdadeira, e
temos de defendê-la, pois ela expressa o que de mais
profundo temos como indivíduos. Que a vida em
sociedade não possui um sentido imediato, isso já está
dado: sociedade não existe sem ausência de sentido. Me
pergunto freqüentemente, principalmente como
professor: o quão corrompidos interiormente estamos
todos, na medida em que nos esforçamos tenazmente dia
após dia e há séculos para nos apartamos da Natureza
da qual somos apenas mais uma peça entre muitas
outras? Na faculdade de Ciências Humanas não tivemos
um belo preâmbulo do que enfrentaríamos como seres
sociais plenos?

Os deuses existem para nos ensinar a experimentar a
jornada de sermos humanos. Na Índia existe um ditado
ancestral: “o hóspede é Deus”. Não é irônico que
quando Deus venha finalmente nos visitar (já se disse,
inclusive, que Ele é brasileiro), nós lhe repudiemos
como todo filhote ingrato faz quando confronta seu
espelho?

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